O Brasil está enfrentando outra onda de calor, com temperaturas que podem variar entre 5 e 10 graus acima da média. Esse cenário alarmante levou o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) a emitir um alerta vermelho, indicando a gravidade da situação.
Até a próxima sexta-feira (27/9), diversas regiões do país, incluindo o Rio de Janeiro, poderão ver os termômetros ultrapassando os 37 graus. A baixa umidade do ar acentua ainda mais os riscos, elevando a probabilidade de incêndios florestais. Ao todo, 11 estados serão impactados por essa onda de calor. Além do Rio de Janeiro, os estados de São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, sul de Goiás, Triângulo Mineiro, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Acre, Amazonas e Rondônia também sentirão os efeitos das altas temperaturas.
A expectativa é que a combinação de calor intenso e ar seco se intensifique até quinta-feira. Embora algumas regiões brasileiras estejam acostumadas a enfrentar altas temperaturas e os brasileiros, em geral, estejam mais adaptados ao calor do que populações de países europeus que recentemente passaram por ondas de calor, essa situação é particularmente preocupante por sua intensidade extrema.
A exposição a essas temperaturas elevadas, especialmente entre 12h e 16h, pode provocar mudanças significativas no organismo, apresentando riscos à saúde, especialmente para grupos mais vulneráveis. Idosos, pessoas com condições de saúde preexistentes e crianças pequenas são os mais afetados, e devem tomar precauções rigorosas durante esse período crítico para evitar complicações de saúde.
É essencial que todos fiquem atentos aos sintomas relacionados ao calor e busquem formas de se manter hidratados e protegidos.
O que ocorre com o corpo quando exposto a temperaturas extremas?
Quando o corpo enfrenta estresse térmico, ou seja, é submetido a temperaturas extremas, ele realiza várias adaptações fisiológicas para manter a temperatura interna sob controle.
Ao ser exposto ao calor, a primeira resposta do organismo é dissipar o calor por meio da transpiração e da dilatação dos vasos sanguíneos periféricos, permitindo a liberação de calor para o ambiente. Entretanto, em condições de calor intenso, especialmente quando a umidade está elevada, o mecanismo de resfriamento pelo suor pode se tornar ineficaz. Isso pode resultar em superaquecimento corporal, insolação e até danos a órgãos.
“Quando estamos expostos a temperaturas mais elevadas, ocorrem adaptações no nosso corpo. A frequência cardíaca aumenta como um mecanismo compensatório, assim como a pressão arterial”, explica Lucas Albanaz, clínico geral, coordenador da clínica médica do Hospital Santa Lúcia, de Brasília, e mestre em ciências médicas.
Outro risco, alerta o médico, é a desidratação devido ao aumento da sudorese. A depender da temperatura, complementa o médico Alexander Daudt, os sinais vão de câimbra (por falta de eletrólitos, eliminados no suor), a sede intensa e fadiga.
“Outros sintomas mais graves, como tontura, náuseas ou vômitos também podem aparecer. Se a pessoa não conseguir aliviar esse calor, o quadro pode evoluir para choque térmico, com confusão mental, convulsões, e seguindo para a falência de múltiplos órgãos e óbito”, explica ele, que é coordenador do Núcleo de Medicina de Estilo de Vida do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre. De acordo com o relatório do The Lancet, nos últimos 20 anos o aumento da mortalidade relacionado com o calor excessivo em pessoas com mais de 65 anos aumentou em 53,7%.
Apenas na Europa, em 2022, ocorreram 61.672 mortes atribuíveis ao calor entre 30 de maio e 4 de setembro de 2022, segundo uma análise recente publicada na Nature Medicine.
Os riscos são maiores para pessoas com comorbidades, pessoas idosas, especialmente aquelas com saúde fragilizada, crianças (por ainda estarem com o organismo em formação), trabalhadores que precisam se expor ao sol (como vendedores ambulantes), e aqueles que fazem uso de medicações que por algum motivo os tornem mais vulneráveis ao calor.
“É o caso de pacientes que tomam remédios diuréticos, por exemplo. Eles naturalmente já perdem mais água, e precisam de cuidado extra com hidratação”, aponta Daudt.”
Como se resguardar do calor intenso?
Hidrate-se! Aumente a ingestão de água, sucos naturais, água de coco, mesmo sem sentir sede. Água gelada pode? Pode! O corpo humano regula a temperatura da água que bebemos, aquecendo-a até encontrar o equilíbrio térmico. Uma boa notícia para você se manter hidratado de forma refrescante neste calor.
Use roupas leves, com cores claras, que absorvem menos calor. Tecidos naturais como algodão e linho são mais indicados.
Consuma alimentos leves. O próprio corpo pede alimentos mais leves, por gastar menos calorias para manter a temperatura ideal, cerca de 36 ºC. Comer alimentos pesados (muito calóricos) ou quentes pode provocar tontura, sono e cansaço.
Trabalha dirigindo? A temperatura no interior do carro também é importante. Dirigir com calor excessivo pode causar desconforto e fadiga, contribuindo para acidentes. Especialistas recomendam que a temperatura no interior do veículo fique entre 22° e 24°.
Use filtro solar em todas as áreas expostas ao sol, com FPS superior a 30. Trabalha em área externa? Aplique o filtro a cada duas horas e abuse de chapéus, bonés e óculos escuros.
O ar-condicionado ajuda, mas deixa o ambiente mais seco. Então, lembre-se de fazer lavagem nasal diária.
Se os olhos estiverem ressecados, colírios lubrificantes são bem-vindos.
De acordo com a Dra. Isabella, pessoas com comorbidades, idosos e crianças são os mais vulneráveis ao calor, pois possuem menos mecanismos de compensação. “É necessário dar atenção a alguns sintomas, pois as altas temperaturas podem colocar as pessoas em risco”.
Alguns deles são: câimbras, tonturas, náuseas e, em casos mais graves, confusão mental, convulsões e até infarto, no caso de pessoas com predisposição a ter doenças cardiovasculares.
Ao sentir qualquer mal-estar, é necessário procurar ajuda. Em casos graves, como convulsões e delírios, procure ajuda médica imediatamente.
Por que as temperaturas têm subido?
As temperaturas do planeta têm aumentado nas últimas décadas.
Especialistas indicam que esse fenômeno, denominado aquecimento global, resulta do acúmulo crescente de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa na atmosfera, originados principalmente da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento.
Quanto maior a concentração de dióxido de carbono e outros gases, maior o impacto negativo sobre a vida na Terra. Esses gases capturam a radiação solar refletida pela superfície do planeta, resultando na retenção de calor na atmosfera.
Dessa forma, o mundo se torna progressivamente mais quente, acelerando as mudanças climáticas e elevando o risco de eventos climáticos extremos, como as intensas ondas de calor observadas atualmente no Hemisfério Norte, além de incêndios florestais, monções e enchentes.
Com as temperaturas aumentando em toda a Terra, há, segundo os especialistas, duas palavras de ordem: mitigação e adaptação.
A mitigação envolve medidas a longo prazo para proteger o planeta.
Na edição de 2022 da Conferência das Partes, encontro da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP26, quase 200 países assinaram o compromisso de tentar garantir o cumprimento da meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C.
O objetivo do acordo é reduzir as emissões muito rapidamente, diminuindo-as em 50% até 2030, e alcançar emissões líquidas zeradas dos gases de efeito estufa antes da metade do século, seguido pela remoção significativa de dióxido de carbono da atmosfera na segunda metade do século.
“No entanto, não estamos caminhando nessa direção, pois as emissões em 2022 foram as mais altas registradas desde o final do século 18, com a evolução industrial, principalmente crescendo muito nos últimos 50 a 60 anos em todo o mundo”, avaliou o climatologista Carlos Nobre, ex-presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas e doutor em meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, em uma reportagem da BBC News Brasil publicada em julho.
“Portanto, a situação do clima é extremamente arriscada, mesmo que tenhamos sucesso total no acordo de Paris [acordo prévio que foi aperfeiçoado na COP26].”
A reportagem a seguir foi publicada originalmente em novembro de 2023 e atualizada em setembro de 2024.