De que forma as eleições municipais podem repercutir nas eleições de 2026?

No próximo domingo (6/10), os brasileiros irão às urnas para eleger prefeitos e vereadores em seus 5.569 municípios. No entanto, as escolhas que fizerem não se restringirão apenas às suas localidades. O impacto dessas eleições pode reverberar em níveis mais amplos, influenciando o cenário político nacional e as futuras decisões que afetarão todo o país.

Os resultados das eleições de 2024 podem ter um impacto significativo na política brasileira, moldando o cenário para as eleições de 2026. Neste ano, o país definirá não apenas quem será o próximo Presidente da República e os governadores, mas também as novas composições do Congresso Nacional e das assembleias estaduais. Dessa forma, o que acontecer nas urnas em 2024 pode influenciar a dinâmica política e as alianças partidárias nos próximos pleitos.

Eleições Municipais será em 06/10.

 

Segundo a análise de especialistas, não é correto assumir que o partido que conquistar o maior número de prefeituras e cadeiras na câmara municipal estará automaticamente em uma posição vantajosa na disputada corrida pelo Palácio do Planalto. Um exemplo ilustrativo é o desempenho do PT nas eleições de 2020: a sigla elegeu apenas 183 prefeitos, o que representou o menor total em 16 anos, e, pela primeira vez na sua história, não conseguiu eleger nenhum prefeito nas capitais estaduais. Apesar desse resultado decepcionante, o partido conseguiu, apenas dois anos depois, retomar o controle do Executivo federal com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em seu terceiro mandato, demonstrando que a dinâmica eleitoral pode ser mais complexa do que os números locais sugerem.

Mas, se o saldo das urnas municipais não é uma prévia da eleição nacional, por outro lado, funciona como um bom termômetro da força dos partidos na construção das alianças para a disputa eleitoral seguinte.

“A ligação entre os dois pleitos ocorre mais no campo da elite política do que na preferência do eleitor”, diz o cientista político Rafael Cortez, sócio da Tendências Consultoria e professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

“Em alguma medida, a eleição municipal dá a balança de poder com que os partidos vão jogar quando forem construir os seus palanques e suas estratégias eleitorais na disputa nacional.”

No entanto, do ponto de vista do eleitor, o efeito de uma eleição sobre a outra é menor, diz Cortez.

“A preferência do eleitorado em relação a partido A ou B em 2024 não necessariamente se repete em 2026, porque, na verdade, o eleitor está avaliando [na eleição municipal] o desempenho dos governos locais.”

A cientista política Beatriz Rey, pesquisadora na Fundação POPVOX, nos Estados Unidos, e pós-doutoranda na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), faz uma leitura semelhante.

salvador, bahia, brasil – 31 de julho de 2018: urna eletrônica usada em eleições no Brasil e vista na cidade de Salvador.

 

Rey chama atenção para um aspecto imediato que surge a partir dos resultados das eleições municipais: a forma como os partidos se prepararão para a disputa pelo controle do Congresso em 2025. Isso é particularmente relevante no contexto da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, onde a corrida para escolher o sucessor de Arthur Lira (PP-AL) está se tornando cada vez mais competitiva.

“A eleição municipal não deve ser interpretada como um ensaio para 2026”, ressalta a cientista política, enfatizando a importância de entender as eleições locais em seu próprio contexto.

Ela explica que o que essas eleições municipais vão evidenciar é a dinâmica interna dos partidos, suas estratégias de mobilização e a força que cada um deles detém. Essa força é crucial tanto para a disputa pela Presidência da República quanto para a presidência da Câmara, que, segundo ela, é tão significativa quanto a corrida pelo Palácio do Planalto.

Além disso, o cientista político Cláudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), complementa essa análise ao mencionar que há diversas pesquisas que demonstram que as eleições municipais frequentemente servem como bons preditores do desempenho dos partidos nas eleições para a Câmara dos Deputados nas eleições subsequentes. Isso indica que, apesar de não serem um reflexo direto da eleição presidencial, as movimentações e resultados locais podem fornecer insights valiosos sobre as tendências políticas futuras.

“O eleitor tende a escolher o deputado que tem capacidade de fazer uma campanha mais forte nos municípios. Quem tem prefeito e vereador trabalhando na sua campanha é claro que tem uma vantagem”, diz Couto.

“Mas, para presidente, a dinâmica é completamente outra, não obedece essa mesma lógica.”

Qual partido ou candidato tem mais chances de conquistar o maior número de prefeituras?

Os entrevistados apontam que a centro-direita e a direita devem continuar a dominar a maior parte das prefeituras do país nas próximas eleições.

Rey destaca que o PSD, liderado por Gilberto Kassab, e o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, estão bem posicionados para conquistar o maior número de cidades. Em contrapartida, partidos como o MDB e o PSDB parecem estar em um processo de retração, o que pode indicar uma mudança no panorama político local.

Cortez, por sua vez, enfatiza a importância das urnas neste ano, uma vez que elas poderão influenciar significativamente a forma como a direita se organizará para a disputa nacional. A incerteza sobre quem sucederá Bolsonaro, que se tornou inelegível após sua condenação eleitoral, gera uma lacuna na liderança desse campo político, o que pode afetar suas estratégias futuras.

Diversos nomes têm surgido como potenciais candidatos à presidência, incluindo os governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo; Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás; Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais; e Ratinho Junior (PSD), do Paraná. Cada um deles traz consigo um histórico político que pode influenciar suas chances e a dinâmica das próximas eleições, tornando a disputa mais acirrada e interessante.

 

 

Para Cortez, o resultado da disputa pela prefeitura de São Paulo é crucial, especialmente porque dois candidatos competitivos estão na corrida: o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o empresário Pablo Marçal (PRTB). Ambos buscam atrair o eleitorado bolsonarista, e isso pode indicar qual será o perfil do futuro sucessor de Jair Bolsonaro.

“Embora ainda não haja um nome definido, havia uma expectativa crescente de que a direita apresentasse um candidato mais moderado em comparação a Bolsonaro nas próximas eleições presidenciais”, observa o cientista político. Ele sugere que essa tendência poderia resultar em uma abordagem mais conciliatória e menos polarizadora.

Cortez destaca que “o cenário ideal para esse campo político seria uma aliança semelhante àquela formada por Ricardo Nunes, que conseguiu reunir quase todas as forças da direita e da centro-direita contra a esquerda, representada pelo candidato apoiado por Lula, Guilherme Boulos, do PSOL.” Essa coalizão é vista como uma estratégia eficaz para maximizar a força do campo conservador nas eleições.

Entretanto, a possibilidade de um segundo turno entre Boulos e Marçal não pode ser descartada, dado que as pesquisas apontam uma disputa acirrada entre os três candidatos — Marçal, Boulos e Nunes — que estão bastante embolados na liderança. Essa incerteza pode complicar as estratégias dos partidos envolvidos.

Cortez acrescenta que “o desempenho de Marçal ao longo da corrida eleitoral sugere que existe um espaço no mercado eleitoral para um candidato que adote uma abordagem mais disruptiva. Isso indica que a alternativa pode não ser uma versão moderada do bolsonarismo, mas sim uma figura que traga uma proposta diferente e atraente, o que poderia redefinir a dinâmica política em 2026.”

Embora o atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, conte com o apoio oficial de Jair Bolsonaro, o empresário Pablo Marçal conseguiu atrair uma parte significativa dos apoiadores do ex-presidente. Isso se deve ao seu discurso agressivo e radical, que ressoa com a base mais extremada do bolsonarismo.

Nesse contexto, Bolsonaro tem optado por não se envolver diretamente na campanha de Nunes, preferindo focar seus esforços em apoiar outros candidatos em diferentes regiões do país. Essa estratégia sugere uma tentativa de ampliar sua influência em outras frentes, possivelmente em resposta à concorrência que Marçal representa.

Na última semana de campanha, Bolsonaro realizou uma série de atos em Vitória (ES) e em três cidades do interior paulista — São José dos Campos, Taubaté e Guaratinguetá. Ele encerrou sua agenda no Rio de Janeiro, onde participou de compromissos em Angra dos Reis, Duque de Caxias, Belford Roxo e na capital fluminense. Em relação ao Rio, seu candidato, Alexandre Ramagem (PL), enfrenta um cenário desafiador, já que as pesquisas indicam a possibilidade de uma derrota para o atual prefeito, Eduardo Paes, ainda no primeiro turno.

Esse cenário evidencia a complexidade da atual disputa política, onde as estratégias de apoio e a dinâmica entre candidatos estão em constante evolução, refletindo as tensões e as mudanças nas preferências do eleitorado. A habilidade de cada candidato em mobilizar sua base e atrair novos apoiadores pode ser decisiva para o resultado das eleições.

Reforma ministerial com o objetivo de ‘fragmentar’ a direita

Essa estratégia busca dividir as forças conservadoras, criando um cenário onde diferentes grupos e interesses dentro da direita possam ser atraídos ou desestabilizados. Por meio de mudanças na composição do governo, o intuito é enfraquecer a unidade entre os partidos de direita, dificultando a formação de uma oposição coesa. Essa abordagem pode envolver a distribuição de ministérios a diferentes facções, a fim de cultivar alianças e, ao mesmo tempo, gerar tensões internas que prejudiquem a eficácia da direita como um bloco unificado nas próximas eleições.

Do lado da esquerda, Cortez analisa que as eleições de 2024 demonstraram que Lula dispõe de menos capital político do que em ciclos anteriores. O presidente teve uma participação relativamente limitada nas disputas municipais, mostrando-se um cabo eleitoral menos proeminente neste pleito em comparação com o passado.

A única exceção foi a eleição em São Paulo, onde Lula esteve um pouco mais engajado, participando de dois comícios de Guilherme Boulos no dia 28 de agosto e marcando presença no evento de encerramento da campanha na Avenida Paulista, realizado no dia 5 de outubro. Esses atos foram as raras ocasiões em que o presidente se destacou como apoiador de um candidato específico.

Entretanto, sua agenda internacional, que inclui viagens recentes aos Estados Unidos e ao México, impactou sua presença nas campanhas. Um exemplo disso foi a decisão de desmarcar um compromisso agendado com Boulos no final de setembro, o que gerou críticas e descontentamento entre alguns aliados.

Os entrevistados, no entanto, não veem a atuação eleitoral de Lula como um reflexo de sua força ou fraqueza para a corrida de 2026. Rey observa que “muitos candidatos estão expressando insatisfação pela falta de apoio de Lula como cabo eleitoral, mas não se pode inferir nada sobre suas chances de reeleição com base nessa situação.”

Diante da expectativa de uma forte performance da centro-direita e da direita nas eleições municipais, Cortez acredita que Lula provavelmente promoverá uma reforma ministerial. Essa estratégia visa dividir o campo da direita e da centro-direita, evitando que esses grupos se unam em torno de um único candidato para as eleições presidenciais de 2026. Essa movimentação é vista como uma tentativa de manter a fragmentação política, dificultando a consolidação de uma oposição forte e unificada.

Atualmente, partidos alinhados a esse espectro político estão integrados ao governo, com o objetivo de garantir apoio legislativo no Congresso. No entanto, essa parceria nem sempre se traduz em suporte efetivo nas votações.

O PSD, por exemplo, lidera três pastas ministeriais: Minas e Energia, Agricultura e Pesca. Essas pastas são consideradas estratégicas, dado que lidam com setores essenciais da economia brasileira, refletindo a importância do partido na formação da base governamental.

O União Brasil, por sua vez, também controla três ministérios: Comunicações, Turismo e Integração e Desenvolvimento Regional. A presença desse partido em áreas como Turismo e Comunicações sugere uma busca por ampliar a influência em setores que podem ser fundamentais para a imagem e a promoção do governo.

Os Republicanos e o PP têm uma participação mais modesta, com cada um comandando um ministério: o Ministério de Portos e Aeroportos está sob a responsabilidade dos Republicanos, enquanto o Ministério do Esporte é gerido pelo PP. Essas pastas, apesar de menores em comparação com outras, ainda são vitais para a infraestrutura e o desenvolvimento social do país.

Por outro lado, o PL se destaca como o principal partido de oposição e, por isso, não faz parte da Esplanada. Sua posição opositora o coloca em uma situação de constante vigilância em relação às ações do governo, buscando contestar e influenciar as decisões políticas de maneira a defender seus próprios interesses e ideais. Essa dinâmica entre governo e oposição é crucial para entender o panorama político atual e as alianças que moldam a governabilidade no Brasil.

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